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“Matriarcas: Mulheres de Raça e de Cor”

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“Matriarcas: Mulheres de Raça e de Cor”

O escritor e pesquisador da cultura africana no Brasil, André Sampaio, publicou pela editora Riemma, seu novo livro “Matriarcas: Mulheres de raça e de cor” que explica a sua paixão pelos alicerces da cultura brasileira, isto é, a significativa presença africana na construção social e cultural da terra do paubrasil.

O autor elegeu três grandes autoras da cultura afro-brasileira: Mãe Beata de Yemonjá, Conceição Evaristo e Fabiana Cozza.

Mãe Beata, já falecida, autora de “Caroço de Dendê”, um grupo de minicontos nos moldes africanos. Mãe Beata de Yemonjá foi uma “Griot” (pessoa que preserva e transmite conhecimentos, histórias, canções e mitos de seu povo).

Já com Conceição Evaristo, o livro aborda o romance “Ponciá Vicêncio”, uma história comovente sobre uma menina/mulher que busca a sua própria identidade dentro de uma sociedade marcada pelo ranço colonial.

Ponciá Vicêncio lembra todas as mulheres negras do Brasil, que lutam diariamente por um espaço justo dentro da sociedade.  

A cantora e autora Fabiana Cozza, ultrapassa os limites impostos pelo social, provando que ser brasileiro é fazer parte de inúmeras culturas distintas.

Três perguntas para o autor

Cansei De Ser Pop: André, qual foi seu caminho na escolha dessas três mulheres tão importantes para a nossa cultura e identidade?

André Sampaio: Quando eu estava no segundo semestre da minha graduação, em 2003, decidi trazer para a minha monografia de conclusão de curso um pouco da minha religião. Comecei a buscar e perguntei a minha professora da época Mailsa Passos, de Cultura Beasileira, qual obra eu poderia trabalhar?
Ela me respondeu: o livro encontrará você! Não procure!
E assim foi! Um dia num sebo de livros vi na prateleira de obras sobre religiões afro-brasileiras uma capa que me chamou a atenção por ser parecida com papel de pão.

Peguei o livro e ali estava Caroço de Dendê de Mãe Beata de Yemonjá. Abri o livro e me deparei com inúmeros contos que traziam os mitos iorubás. Pensei: achei o tema da minha monografia. Tive dificuldade ao trazer o tema para o meio acadêmico, mas não esmoreci e fui até o final! Passei a conviver com a Mãe Beata em seu terreiro para não deixar passar nenhuma riqueza de sua personalidade.

E assim foi! Escrevi oitenta páginas e recebi indicação para a publicação da banca inteira. Foi incrível! Já Conceição Evaristo conheci com a minha orientadora da própria graduação, Luciane Nunes, que me orientou no processo de escrita da monografia sobre Mãe Beata. Conceição era amiga dela e ela fez questão de me apresentar.

Na época Conceição Evaristo não era tão conhecida. Comecei a namorar a obra dela e resolvi falar sobre ela no mestrado. Quando cheguei na UFF quem estava lá estudando também? Conceição Evaristo! Eu no mestrado e ela no doutorado! Tivemos a mesma orientadora, Laura Padilha, especialista em Literatura Africana de Língua Portuguesa.

Minha dissertação foi sobre a Conceição e sobre Mia Couto, autor moçambicano. E no meio dessa trajetória toda eu já ouvia Fabiana Cozza…
Conheci num domingo pela manhã no canal da TV Cultura. Sempre amei Clara Nunes, era ninado ao som de Ijexá, canção interpretada por Clara. E naquela manhã de domingo me deparei com uma voz incrível cantando ijexá também. Me apaixonei na hora por Fabiana Cozza e fui até o Orkut ver se conseguia o contato dela. Ela aceitou o meu convite e passei a segui-la como fã mesmo!

Quando cheguei em São Paulo e me tornei sócio do Grupo Prismma, quem estava na lista de projetos culturais da empresa? Sim, Fabiana Cozza! Ela participou de um outro projeto nosso e hoje é minha amiga!
Quanto às autoras acredito que foi o destino e os orixás que colocaram em minha vida essas mulheres brilhantes!

CSP: Nos conte um pouco do seu longo percurso de estudo sobre diferentes formas de narrativas na formação da tradição de um povo?


André Sampaio: Somos compostos por narrativas! Narramos o tempo todo! Quem não tem uma boa história para contar? A própria literatura universal nasceu desse desejo pelo contar histórias! Nossas histórias formam a nossa memória pessoal e coletiva. E o arcabouço de toda sociedade vem da memória. Um dos autores que trago no livro, Paul Zumthor, diz:

“Todo grupo tem um saber acumulativo, originário da memória e que é agregado na linguagem, pois a cultura de uma sociedade é determinada pelo uso que essa mesma sociedade faz da memória. As tradições orais são fundamentais para a manutenção dos costumes e servirão de alicerce para a constituição da história de uma sociedade.”

Logo, acredito que o ato de narrar, seja escrito ou oralizado constrói o que somos. O papel das narrativas consolida a formação da nossa identidade e é dela que vem essa noção sobre aquilo que chamamos de tradição.

CSP: Você cita no início do livro as matriarcas da sua vida, mulheres da sua família que te impulsionaram a ser o homem que é hoje. Você pode nos contar um pouco dessa influencia feminina na sua formação?

André Sampaio: Fui criado envolto a mulheres espetaculares. Seja em casa, seja nas instituições de ensino e religiosas que frequentei e que frequento. Desde muito cedo grandes mulheres foram me dando exemplos de como ver, viver e sonhar a vida. Pois o olhar feminino é diferenciado, não há como não ser influenciado por essa força motriz que nos gera, alimenta e inspira!
Fui, na verdade, um sortudo.

Pois tenho mulheres excepcionais na construção da minha identidade, na construção da minha concepção religiosa e na construção da minha formação acadêmica!

Tenho 3 irmãs guerreiras, inúmeras sobrinhas, tenho mãe biológica e mãe de santo, trago Oxum guiando os meus caminhos, meus maiores laços de amizade são com mulheres, fui alfabetizado e formado academicamente por professoras e isso certamente, traz um diferencial.

Sou o que sou porque tive e tenho grandes mulheres ao meu redor, matriarcas que garantem em mim a sensibilidade necessária para continuar olhando o mundo com os olhos sempre marejados de emoção.

Uma dessas mulheres que cito no livro, uma grande amiga chamada Andréa Franco, me chama pelo apelido carinhoso de “Olhos brilhantes” e esse brilho só existe porque a construção do meu olhar sobre o mundo sempre foi moldado através de olhares intimamente femininos. Reitero, sou o homem que sou porque tenho grandes mulheres em minha vida e a elas dedico esse meu primeiro livro como uma espécie de agradecimento e devoção.

O livro também conta com um capítulo teórico que antecede a análise das três autoras, propondo um mergulho na história, na sociologia, na filosofia, na literatura, na antropologia e na Teologia para tentar entender o universo em que cada autora se encontra. Para isso, o autor lança mão das teorias de Paul Zumthor, Walter Benjamin, Stuart Hall e Hommi Bhabha, entre outros.  

Fotos: Agência CSP/Divulgação

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